Os impactos das alterações climáticas representam um risco cada vez maior para as empresas, instituições financeiras e sistema financeiro no seu todo, que precisam de reforçar a sua gestão de risco, com especial destaque para os riscos climáticos.
Os riscos climáticos podem ser agrupados em duas categorias:
- Riscos físicos – onde se inclui o impacto financeiro das alterações climáticas, como a ocorrência mais frequente de fenómenos meteorológicos extremos e de alterações climáticas graduais, bem como da degradação ambiental, como poluição, pressão sobre os recursos hídricos, perda de biodiversidade e desflorestação. O risco físico é categorizado como “agudo” quando decorre de eventos extremos, como secas, inundações e tempestades, e como “crónico” quando resulta de mudanças progressivas, como o aumento da temperatura ou do nível médio das águas do mar.
- Riscos de transição – onde se incluem as perdas financeiras de uma instituição, que podem resultar, direta ou indiretamente, do processo de ajustamento para uma economia hipocarbónica e mais sustentável. Estes riscos manifestam-se não só através de políticas, mas também ao nível da mudança tecnológica, risco reputacional e de mercado.
Os reguladores financeiros, como os Bancos Centrais, desempenham um papel fundamental para garantir a estabilidade financeira e, por isso, devem ser capazes de avaliar sistematicamente estes riscos climáticos.
Para compreender a exposição ao risco e resiliência, os supervisores estão a recorrer aos Climate Risk Stress Tests – Testes de Esforço Centrados no Risco Climático, baseados em cenários. Um teste de esforço é um exercício “what if – e se”, onde são estudados vários cenários e quais as consequências, para analisar qual a melhor forma de gerir esses riscos potenciais. No caso dos testes de esforço climáticos é avaliado o impacto das alterações climáticas, incluindo riscos climáticos severos, para avaliar o impacto potencial das alterações climáticas no modelo de negócio das instituições e quais os riscos financeiros subjacentes. Este exercício é fundamental para as instituições financeiras perceberem se estão preparadas para lidar com as consequências dos riscos climáticos.
É importante referir que cenários não são previsões. No entanto, e dado os vários avisos do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) em relação às alterações climáticas, estes cenários são cada vez mais prováveis e as empresas devem começar a preparar uma resposta adequada.
Em outubro de 2021, o Banco Central Europeu (BCE) publicou as instruções metodológicas de suporte ao exercício de 2022 relativo aos testes de esforço centrados no risco climático, sobre o qual 104 bancos significativos participaram. Esta avaliação foi composta por 3 principais módulos:
- Módulo 1 – Questionário: avaliação da capacidade dos bancos relativamente ao desenvolvimento das suas capacidades na construção dos testes de esforço climáticos como ferramenta de gestão de risco. Este questionário desdobrou-se em 78 questões sobre governo; apetite ao risco; estratégia; dados; métricas de risco climático; aplicação da estrutura, metodologia e cenários dos testes de esforço climáticos.
- Módulo 2 – Análise de benchmark entre bancos: comparação de métricas de risco climático, incluindo a dependência dos bancos em receitas em indústrias intensivas em carbono (juros, taxas e comissões) e volume de emissões de GEE financiadas.
- Módulo 3 – Testes de esforço bottom-up sobre riscos físicos e de transição: avaliação do impacto de eventos de clima extremo, potenciais aumentos repentinos no preço das emissões de carbono e como os bancos devem responder aos cenários de transição nos próximos 30 anos. O impacto dos riscos de transição foi considerado numa perspetiva de risco de crédito, de mercado, operacional e de reputação, assim como em termos qualitativos.
Importa salientar que foram utilizados cenários macrofinanceiros baseados em cenários elaborados pela Network for Greening the Financial System – NGFS. Estes cenários analisam a resiliência dos bancos aos riscos de transição de curto e longo prazo (através de novas políticas e tecnologias low-carbon) bem como riscos físicos (associados a eventos climáticos extremos, tais como uma inundação ou uma grande seca).
Os resultados deste exercício foram publicados pelo Banco Central Europeu (BCE) a 8 de julho de 2022, com as seguintes principais conclusões:
- cerca de 60% das instituições de crédito ainda não dispõem de um quadro de “teste de esforço centrado no risco climático”;
- a maior parte das instituições de crédito não inclui o risco climático nos modelos do risco de crédito e apenas 20% consideraram o risco climático como uma variável na concessão de empréstimos;
- quase dois terços do rendimento das instituições de crédito com clientes empresariais não financeiros provêm de setores com elevada intensidade de emissões de gases com efeito de estufa (GEE). Além disso, carecem de dados reais sobre emissões de GEE, sendo que cerca de 70% dos dados relativos às emissões de âmbito 1, 2 e 3 são estimativas, o que pode criar desvios nos resultados;
- o teste de esforço revela que as perdas de crédito e de mercado na transição desordenada de curto prazo representam cerca de 70 mil milhões de euros para as 41 instituições;
- quanto às projeções de longo prazo das instituições de crédito, os resultados mostram que uma transição ecológica ordenada se traduz em menores perdas do que numa transição desordenada ou no caso de não serem adotadas quaisquer medidas em termos de políticas.
Os riscos das alterações climáticas são inegáveis, mas os estudos também demonstram que uma transição planeada e preparada para uma economia mais verde acarreta menos custos e imprevisibilidades.
Este exercício de aprendizagem demonstrou que as instituições financeiras apresentaram alguns progressos na incorporação de riscos climáticos, mas ainda há um longo caminho pela frente. O Teste de Esforço revelou muitas lacunas na recolha de dados e inconsistências entre as instituições e, é por isso fundamental que as instituições de crédito obtenham melhores dados dos clientes e dependam menos de aproximações. Os resultados serão utilizados como referência para as instituições de crédito europeias reforçarem as capacidades de teste de esforço e se prepararem para os riscos e as oportunidades de uma transição para a neutralidade carbónica.
Destacamos ainda que, em 2020, o BCE publicou um Guia sobre riscos climáticos e ambientais onde descreveu a forma como espera que as instituições considerem estes riscos na formulação e implementação de estratégias de negócio e quadros de governação e de gestão do risco. Este Teste de Esforço é importante para perceber até que ponto as expectativas do BCE para as instituições financeiras, descritas no Guia, estão a ser cumpridas.
Artigo por equipa PwC Portugal